domingo, 15 de abril de 2018

Pouco bastante



Olhos fechados, fico na cama um pouco mais.
Permito-me.
Permito-me não levantar num pulo,
Não deixar a cama automaticamente,
Condicionada, comandada por ponteiros, dirigida por deveres.
Permito-me ficar.
Só mais um pouquinho.
Pálpebras cerradas... e toda atenção.
Sinto a textura dos lençóis, meu calor particular.
Percebo coração bater, palpitar,
A vida pulsar... ecoando em mim... até à pele.
Ouço a música dos passos vizinhos, o movimento de fora,
Carros, cantos, passarinhos...
E o som singular da própria circulação.
Permito-me ficar.
Só mais um pouquinho.
Parada.
Andando só com o sentir, com tento.
Imersa no momento.
Constatando sabor da inação na inércia cheia de intensidade.
Completa-mente inteira ali.
Simples-mente plena em pouco que é muito... especial.
Nada há de novo, nada que não tenha já vivido.
Nada que não tenha vivido antes... sem viver de verdade.
E ali está, ao alcance do querer.
Um mergulho no minuto, no segundo, na presença.
Sem nada adicionar, sou acrescida.
Preenchida, alimentada do pequeno que é grande
E passa... despercebido.
Que escorre entre as horas, dentro - ou fora - de atos desavisados,
Misturado ao invisível, um aparente coisa alguma.
A cabeça trabalha diferente... e muda tudo, mesmice some
Sem que corpo faça esforço.
Carne ainda descansa e... cresci.

Permitir-se ficar... atento, absorto pelo ensejo,
Muda além: o passo seguinte também.
De ouvinte de ser, podemos passar a condutores de outro estar.
Mais sereno e mais viiiiiivo !

Permitir-se o novo sem nada novo, soma sem mais possuir.
Perceber que pequeno é grande, o presente que ele porta,
Pode mesmo nos abrir...
Para algo ainda melhor.